4 de julho de 2015

Desabafo de uma negra

Imagem da Internet

Sabe, eu ouço falar de um lugar que parece ser triste. Não se fala muito de lá (a não ser nas notas faladas de tragédias diárias que não passam de 20s nos telejornais). Dizem que lá, pessoas parecidas comigo são mortas, aos montes, todos os dias (será coincidência?).
Onde alunos que têm a minha cor são submetidos a revistas e perguntas humilhantes no caminho da escola. Onde esses mesmos alunos ao se reunirem nas horas de lazer passam logo por uma “geral” da chamada polícia comunitária (nome bonito esse). 

Lá, pequenas Joyces, Majus, Carlos, Joãos são desestimulados, diariamente a estudarem (dizem eles ser difícil enfrentar revistas todo dia, professores preconceituosos e colegas que acham que a carteira não é lugar deles. Fora o risco de morrer no caminho "confundido" com um bandido
Dizem que os que insistem e chegam às graduações, postos de chefia se sentem como um estranho no ninho. Nessa parte eu entro, sei que é o preconceito diário, já ouvi que mulher negra não é pra casar, só pra diversão, que eu entrei numa federal só por causa da cota (que não tive por sinal, mas entender que eu estudei em escola particular é exigir muito da compreensão de muitos), que meu lugar é na senzala, na cozinha, ou na cama. 

Mas, e no mundo de lá? Daqui, o que parece é que é muito querer pensar nele. É mais fácil colocar esses pretinhos “infratores e preguiçosos que tiveram as mesmas oportunidades que eu, graduada, na maior parte dos casos, branca, com pais vivos e presentes na cadeia mais cedo”. Afinal, pra que solucionar a raiz do problema se é mais fácil, barato e mais interessante politicamente mover uma enorme campanha para deixar esses “imundos” mais longe? É mais fácil tratar os Amarildos como meras estatísticas [maqueadas]. 
Enquanto isso, nós, do lado de cá, nos "assustamos" com agressões como a que sofreu Maju, ou a Joyce. Já as Majus e Joyces do lado de lá já estão vacinadas. Encontre o erro!


Trilha sugerida: Ellen Oléria e sua música de resistência!





Autora: Joyce Afonso é mulher negra, feminista e jornalista graduada pela Universidade Federal de Ouro Preto. 

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