23 de dezembro de 2014

Feminismo (em) família

Disfarce de Natal - Imagem da internet
Está chegando o Natal e, para muitas feministas (ou não) , o famoso jantar ou almoço de família é desconcertante. As piadinhas machistas e as infinitas e desnecessárias cobranças familiares: “E os namoradinhos?” “Quando vai casar?” “Quando terão filhos?” “Você não está fazendo regime?” “O seu marido deixa você usar essas roupas?” “Mais uma tatuagem, menina?” e etc etc etc...

É realmente desconfortante perceber que os anos passam, você aprende cada vez mais com o feminismo e tenta desconstruir tudo que lhe foi ensinado, mas algumas coisas não mudam, mesmo no seu ambiente familiar. Mas prepare-se mãe, esse não é um texto para declarar minha aposentadoria feminista ou muito menos um desabafo ou frustração. Eu continuo “feminista demais” e isso é muito bom para mim e para o mundo, confia em mim hein.

O feminismo é algo realmente complexo. Existem várias teorias e jeitos de ser feminista. Ser feminista é um processo, a gente precisa ter paciência para aprender, ouvir, falar, questionar e trocar ideias e experiências. Feminismo não é muito disso do que falam na Tv ou na internet. Por causa dessa deturpação da mídia muita gente acha “moderno ou radical demais” algumas coisas que são simples e claramente atitudes mais humanas diante da vida. Mas hoje não estou aqui para falar só de mim ou do meu feminismo. O meu feminismo eu descobri muito jovem, comecei a construir na universidade e venho construindo e desconstruindo na vida, na internet, na rua, nas conversas de ônibus e por que não, nas festas de família?

Algumas mulheres da família materna - AP


É por isso que hoje decidi dedicar esse espaço a todas as mulheres da minha família. Elas são de outras gerações e mesmo não tendo conhecimento (ou reconhecimento) das teorias feministas, já me ensinaram muito tendo atitudes feministas. São mulheres que podem até não enxergar o machismo em certas situações, mas assim como eu, também são afetadas por ele. Eu já ouvi muitas delas reproduzir discursos machistas, mas sei que isso não é culpa delas e sim do sistema patriarcal e da cultura em que somos criadas.


Não sei se por sorte ou destino, mas tenho família grande dos dois lados, e ambos são formados por maioria de mulheres. Mulheres chefes de família e de personalidades que geralmente se sobressaem as dos homens e companheiros. Seria difícil citar todas aqui e os bons aprendizados e memórias que tenho com tantas mulheres incríveis e admiráveis. Mas vamos lá, mesmo sem as teorias dos livros ou tatuagens, venho agradecer as pequenas lições feministas de vocês.


Tia Lucelene: Você é uma feminista no armário, vamos combinar né? Desde sempre me mostrou que existe um mundo de opções na vida de uma mulher. Não é obrigatório casar-se e nem ser mãe. Mas é de lei correr atrás dos sonhos, por mais que a sociedade te diga que “isso não é para você”. Foi assim que você se tornou referência e uma pesquisadora e professora brilhante da maior universidade do país. 

Tia Marta: Todas as risadas que damos juntas ao falar das suas histórias valem a pena. Eu descobri uma tia que não suporta certo conservadorismo e hipocrisia. Você pode até não achar, mas o lema “o corpo é meu e eu faço o que eu quiser” é bem feminista.

Avó com as primas Carol, Vanessa e Tati - Arquivo pessoal
Tia Ana: Você se casou muito cedo e com um homem um pouco mais velho, um dia eu te perguntei como foi isso e você respondeu “Ah, eu quis ué”. Escolher o que quer pra si, independente do que vão pensar e dos desafios que essa escolha carrega, também é feminista. Além disso, eu soube que você até caminhão já dirigiu pelas ruas de Barretos nos anos 80. Essa ousadia naquela época e com o seu tamanho, também é feminista.

Vanessa, prima: Enfrentar todos os medos para realizar sonhos e seguir o coração também é feminista. Você me mostrou que por mais surreal que pareça o desafio, nós estamos na vida para ter coragem. We are feminist! 

Vanessa, a prima que mora longe

Tia Deise: Quando estou de vestido longo é porque eu quero tá? Mas obrigada por sempre reforçar que posso (e devo) usar short ou saias curtas que também é bonito. Isso também é feminista.

Tia Silvana: Ah, tia Silvana... Você é o que é e ponto final. Esse é seu ponto fraco e também seu ponto forte. Obrigada por essa identidade e por toda falta de papas na língua, você me mostrou que não devemos nos omitir diante de nós mesmas e isso também é feminista!

Tati, prima: Você é a prima que sempre enfrentou os desafios e julgamentos alheios para ter a carreira que quis. Seguiu seu caminho e é vencedora. Isso também sempre foi feminista.

Tia Vera: Ser casada, professora, mãe de três meninos e ainda sobreviver já é digno de um prêmio feminista né? Hahaha. A falta de pudor das suas brincadeiras sempre nos mostrou que mulher deve falar o que pensa sim e se tiverem que gostar de você, será assim. Isso é bem feminista viu...

Tia Néia: A senhora não sabe o quanto é feminista ser bem resolvida e estampar a felicidade depois dos setenta por colher os frutos da sua escolha. Adoro as suas histórias dos bailes de fim de semana com o namorado e a forma leve como leva a vida. Saudações feministas!

Pati, prima: Você decidiu fazer a revolução na própria vida e reescreveu sua história reaprendendo a se amar. Ponto feminista para você!

Vó Vilma: Seus comentários sempre surpreendem quem vê essa cara de vózinha Dona Benta né? Mas o que esperar de uma vó que teria fugido com o circo se ele tivesse passado mais uma vez pela sua porta? Não imagino o quanto deve ter sido difícil encarar um mundo sem escolhas e sem voz, mas a senhora vem provando que nunca é tarde para fazer o que se tem vontade na vida. Obrigada por reconhecer que a liberdade que conquistamos faz parte dos nossos direitos. Isso também é feminista!

Vó Damiana: A senhora sempre foi um símbolo de força e de paz. Não é a toa que é a origem de todas as mulheres da família. Nos ensinou a respeitar as outras e nunca julgar quem acredita que a vida deve ser vivida de um jeito diferente de nós. Se toda a Igreja Católica tivesse sua sabedoria e bom senso para lidar com as pessoas, arrisco dizer que a história do mundo poderia ter sido diferente. Respeito é um fundamento feminista!

Avós - Arquivo pessoal

Mãe: Você vive dizendo que os filhos são reflexos dos pais. Aqui em casa, a filha também é. Sua trajetória e sua autonomia são muito feministas. Você diz que eu exagero, mas tem que entender que eu sou sua versão 2.0 né? Obrigada pelo exemplo de independência e amor próprio. E também por me dizer que mulheres sempre precisam de amigas como apoio e troca de experiência na vida. Você é feminista sim!

Mãe - Foto: Marcos Morais

Para todas que não citei por falta de espaço: o mesmo carinho e agradecimento. Repito, não sei se por sorte ou destino, mas cresci cercada de exemplos de força. O feminismo é um movimento de ações e por menores que elas pareçam, são importantes para a construção de um mundo mais justo. Sobre os namoradinhos... Já adianto que ainda não vai ser nesse Natal, mas vou bem, obrigada! 

PS:Prometo não implicar com a piada do pavê.

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