24 de julho de 2015

Moradores do Jardim Aeroporto manifestam contra reintegração de posse



Na última quinta-feira, (23/7), cerca de 70 pessoas das comunidades João Pessoa e Nazaré Paulista realizaram um ato em frente ao Fórum de Ribeirão Preto. O grupo representa apenas 10% dos moradores do local, mas protestou em nome de todas e todos que estão vivendo sob ameaça de expulsão por duas grandes imobiliárias da cidade. Apesar do processo conter ilegalidades, já que as empresas não tem direito de posse das terras, até agora nenhuma instância de justiça impediu a manobra jurídica e a possibilidade de remoção das pessoas que vivem na lá há anos e não tem para onde ir.


Um dos objetivos da manifestação era tentar alcançar alguma visibilidade da mídia local, afinal, a tv é um meio de comunicação popular e muitas pessoas poderiam ver o que está acontecendo e se sensibilizar de alguma forma. Todas as tvs foram chamadas, apenas uma compareceu para a cobertura. Liguei para um produtor para repassar a pauta, disse o que estava ocorrendo e ele apenas perguntou:

- Está havendo alguma confusão aí?

Eu respondi orgulhosa que não e que estava tudo tranquilo na manifestação. Apesar de serem injustiçados e terem todos os motivos para tomar atitudes que seriam consideradas “radicais” por um canal de tv, os moradores da João Pessoa e Nazaré Paulista são conscientes da marginalização que sofrem e se preocupam em mostrar que são só cidadãos em busca de direitos. Mas a resposta do produtor não acompanhava a inocência do meu raciocínio.

- Ah, se está tudo tranquilo, então não precisa. Mas obrigado por ligar.




Desliguei o telefone sem entender o que ele quis dizer. Será que me formei no jornalismo errado? O que realmente é importante para ser notícia? A conclusão que tiro é que foi inocente de minha parte dizer que “estava tudo tranquilo”. Não está. Talvez “confusão” não seja a palavra mais correta para definir a situação, mas se tem uma coisa que essas pessoas não sabem o que é faz tempo, é tranquilidade.

O que pode ser mais confuso do que receber uma ameaça de pessoas que você não conhece, e ter que aceitar que qualquer voz é mais legítima que a sua? O que é tão confuso quanto fazer uma criança perceber que mesmo quando todas as casas da cidade são maiores que a dela, adultos desconhecidos querem destruir o pouco que ela tem? O que mais pode ser o caos além da insônia diária de preocupação do trabalhador que não sabe se sua casa ainda estará lá quando voltar do trabalho? O que mais pode ser a confusão além de tentar entender instituições milionárias que querem lucrar roubando direitos dos pobres? O que pode ser mais confuso do que a relativização da palavra justiça? Uma mãe tem o direito de decidir por 300? O que é confusão senão uma cidade aonde quem governa mora em mansão e quem elege mora em favela, e ainda precisa brigar pelo direito de permanecer na favela? 





Acho que eu estava errada quando disse ao produtor de tv que não havia confusão. Há um estado geral de confusão e urgência. A tranquilidade só é possível para quem está dentro dos condomínios, a partir das cercas elétricas ou assistindo jornal na tv que não mostra pobre cobrando direito. Mas o protesto seguiu. Mesmo sem megafone, as vozes dos moradores conseguiram ser ouvidas por quem estava dentro do prédio do Fórum. E incomodou. A intenção era entrar no local e tentar um atendimento da juíza do caso, mas não é bem assim que funciona a justiça, nesse caso. Cobrar direitos é incomodar e não se pode incomodar. 



A luta dos moradores de João Pessoa e Nazaré Paulista é dupla, lutam para não serem invisíveis diante de um inimigo que insiste em se fazer invisível. E são vários os que fingem não ver e ouvir. Prefeitura, vereadores, empresários, juízes, jornalistas e todos que receberam cargos para fazer algo oposto ao que estão fazendo. A comunidade está órfã. Orfã e gestante. Está órfã porque ninguém pode responder por ela e ninguém se acha responsável por fazer justiça ou assumir que comete injustiça. Só resta a ela gestar esperança, e enquanto espera, luta para não morrer antes do parto. 


Todas as famílias que moram ali têm ou já tiveram crianças em casa. Todas as mães que moram ali já estiveram gestantes. Geraram ali, sem o conforto de quem pode montar o quartinho do bebê em detalhes, escolher o enxoval ou pagar um plano de saúde. Mas gestaram, por nove meses ou menos estiveram ali esperando por seus filhos. Os filhos cresceram, mas alguns nem tanto, a Manuela, por exemplo, ainda tem só dois anos. Ontem ela perguntou a mãe se vão derrubar a casa dela. 





Na comunidade também tem gestante que além de esperança, gesta um filho, uma delas é a Amanda. A Amanda está carregando um filho, o Arthur. Ela é a mãe dele, mas juntos são órfãos de um Estado omisso e de uma justiça que não tem sido justa com Arthur, Manuela, Amanda e todas as outras mães e crianças que residem e resistem nas comunidades. Quem vai olhar pela infância deles? Quem se preocupa com a gestação delas? Quem vai responder a pergunta da Manuela?


Amanda e Arthur

Comunidade João Pessoa e Nazaré Paulista resistem!


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