23 de junho de 2016

Mulher que cria: Cosméticos feitos em casa e respeitando a natureza



Estreando nossa série Mulher que cria, o Desvio Livre traz uma entrevista com Renata Theodoro, a mulher que criou o Pé de Amora, empresa de cosméticos naturais e artesanais, produtos para aromaterapia e fitoterapia em São José dos Campos, Sp. Renata (ou Tetê, como eu prefiro chamar) é a empresa. Cria os produtos na cozinha da avó com a ajuda da mãe.  Faz, vende, administra, cria o marketing nas redes sociais, fotografa e ainda encontra tempo para dar entrevistas encantadoras como essa que estreia nossa série sobre mulheres que se reinventam e nos inspiram.


Como foi sua trajetória até a criação do Pé de Amora?

Foram voltas e voltas para chegar onde sempre quis: ser artesã. Comecei a vida de gente grande na fotografia, que é uma grande paixão, mas profissionalmente não me encaixei. Segui os rumos e comecei a cursar Pedagogia. Através da faculdade me aproximei dos movimentos sociais, outra grande paixão! O universo acadêmico me instigava a ir cada vez mais fundo nos ambientes externos. Troquei experiências de vida em um assentamento na cidade de São Carlos (SP) chamado Santa Helena. Vivi com os “sem terrinhas” (como são chamadas as crianças que vivem nos assentamentos do MST), com as mulheres da luta, com as dificuldades e avanços de cada morador e lutador. Conheci um pouquinho sobre ervas, plantação e mão na terra, vivências incríveis que me despertaram o encanto pela vida da terra. 
No carnaval chuvoso de 2014 nasceu o Pé de Amora. Uma brincadeira de linhas, tecidos, tintas e objetos reinventados. Digo brincadeira pois assim era, em momentos de distração e invenções. O caderno de ideias e planejamentos é o mesmo até hoje, mas o foco mudou. Com mais voltas da vida eu tranquei a faculdade, voltei para minha cidade natal, São José dos Campos (SP), e conheci a Terapia Holística. Profissão nova e desconhecida por muitos, mas meu encontro pleno de gente grande. O cuidar é um sentimento que pulsa muito forte dentro de mim e neste universo chegamos ao que é o Pé de Amora hoje: cosméticos naturais e artesanais, produtos para aromaterapia e fitoterapia. 





 Quais as vantagens do uso de produtos como os que você produz?

Vocês já pararam para ler os rótulos dos produtos usados no corpo, como xampu, cremes, sabonetes e desodorantes? Existem tantos componentes que não temos ideia do que são, mas os colocamos diariamente em nossos corpos sem questionamentos e fazem um mal danado. Aprendemos que a limpeza ideal precisa de muita espuma, e que nossa pele não pode respirar e nosso cheiro é um grande problema. Desodorantes industrializados prometem proteção por 48h. Sabonetes para higiene íntima prometem que você não vai exalar cheiro algum. Xampus prometem limpeza, restauração, hidratação e recuperação do cabelo danificado por uma vida em apenas uma semana! Vivemos em tempos e pensamentos impostos que me assustam muito, como o uso excessivo de medicamentos, por exemplo. Aprendemos que não podemos nos escutar, pois não há tempo suficiente para isso.  Para além da nossa saúde, podemos ampliar a reflexão para a saúde do planeta também. Resíduos e mais resíduos são gerados por uma indústria que não se importa em encontrar saída concreta para isso. Joga-se uma embalagem fora sem existir o fora. Tudo permanece aqui. 
A cosmetologia natural traz uma visão muito simples: respeite seu corpo. Cuide-se com respeito. Seu odor é um ótimo indicativo de como você está por dentro. Seu corpo necessita respirar. Encontramos na natureza todos os ingredientes necessários para nossos cuidados internos e externos. Ressalto com o carinho de uma buscadora que esse caminho é muito gostoso e gratificante, porém hábitos de uma vida inteira não se mudam do dia pra noite. Dessa forma, você se assusta e desiste. Vá com calma, faça testes, (re) conheça seu corpo e sempre: respeito. 





O que envolve o processo de criação e desenvolvimento do seu trabalho até o produto chegar às mãos de quem consome?

Muito amor envolvido. Como são produtos para uso corporal é necessário muito estudo e teste. Entender qual ingrediente potencializa o outro, qual a reação disso na pele, qual benefício para saúde, etc. Eu sou empreendedora com mãe amorosa e participativa, principalmente para testes! O processo de produção é integral: planejamento, compra de matéria prima, criação do produto, parte gráfica, venda, tudo. E sempre tudo feito com amor. Toda produção é feita em casa, na cozinha da vó. São processos alquímicos incríveis de vivenciar. Confesso que criar sabonetes me fascina muito! Misturar ingredientes e criar um produto final é instigante. Levar esse produto para o consumidor é mais instigante ainda. O processo de venda quando se admira o que faz, é natural e flui. Cada produção é um aprendizado diferente. Por mais que se use a mesma composição, sendo produtos artesanais, cada um cria sua própria cor, textura e aroma. É magia pura!




Quais as dificuldades e os prazeres de fazer o que você faz profissionalmente?

Acredito que toda profissão é uma batalha constante. Mas optar por uma que não te dê uma carteira assinada e registro trabalhista é um pouquinho mais. Empreender é delicioso e arriscado e isso traz julgamentos. Ouço coisas como“Você só faz isso? Não trabalha?”. Tem dia que começo a trabalhar às sete da manhã e vou até de madrugada para atender toda a demanda. Semana de produção é concentração e entrega total. E a cabeça? Essa não para de pensar no Pé de Amora. 
Costumo dizer que é minha filha e exige cuidados o tempo todo. Claro que de maneira respeitosa, buscando novas relações com o trabalho, sem bitolação e excesso. Mas escolher ser dona do próprio negócio me colocou em outro patamar de responsabilidades. Aprender a gerir é um desafio constante. Cuidar do dinheiro, fazer investimentos, cuidar da produção, é tudo um misto de prazer e dificuldade. Mas vale a pena.



Você acredita que seu trabalho é uma forma de resistência enquanto mulher que cria e faz? 

Acredito e busco cada vez mais isso. Resistência na maneira de me cuidar, de me posicionar, de entender a relação entre trabalho e universo acadêmico, resistência ao escutar a famosa frase: “Mas e se você não der conta?”. Cresci numa família incrível e fui a primeira a entrar em uma universidade federal e por um tempo enxerguei isso como a única maneira de levar a vida. Vi meus amigos se formando e me cobrava mais, pois essa era a única maneira de ter um trabalho, ser reconhecida e todas essas questões que martelam nossas mentes. Essas inquietações e as movimentações da vida me tiraram do lugar. Eu nunca me senti pertencente à universidade, isso foi motivo de me cobrar muito. Era tão intrínseca a ideia de que sem um diploma eu não chegaria a lugar algum, que demorei dois anos para germinar a semente Pé de Amora. Hoje ela já está florida, mas precisei abandonar muitos paradigmas que cresci escutando a vida toda. Superei obstáculos pessoais e doloridos, como uma auto estima bem frágil, para conseguir a firmeza e segurança de hoje em dia saber o que busco e procurar caminhos para chegar lá. Com coragem e muito amor, resisto e resistirei cada vez mais a esse ''trabalho ideal" que nos é imposto, à maneira de me cuidar, ao lugar onde colocam mulheres, às barreiras que nos colocam por tentar buscar nossas certezas. 





Quais os caminhos para a construção de uma lógica de consumo menos capitalista e exploratória e mais saudável? 

Respeito. Gosto muito de usar essa palavrinha que é mágica para mim. Respeite seu corpo, sua necessidade, sua situação, seu pensamento, o planeta, as próximas gerações, as atuais e as que já se foram. Respeite a vida. Respeite animais. Saiba o que se compra, por que se compra e o que será feita com essa compra. Respeite. Antes de respeitar, respire. Vamos lá, preste atenção em como anda sua respiração. Perceba como o ar entra, como ele sai, como você se sente. É necessário para nossa saúde mental sair dessa roda viva que virou o mundo. Vivemos hoje a maior crise de ansiedade do planeta. Estamos adoecendo por consumir sem questionar, comemos sem saber o que é, vestimos sem saber de onde vem. Falta tempo para Ser. Vejo muitas mudanças nesse sentido e isso me traz esperança. Fala-se mais sobre consumo sustentável, reaproveitamento, mudanças de hábitos. Mas espero muito, muito mesmo, pelo dia em que isso se expanda para todos os públicos e classes. Infelizmente, ainda é um assunto um tanto quanto elitizado. 





Você acredita que a mudança na relação que as mulheres têm com a natureza é uma forma de empoderamento? 

A relação com a natureza traz à tona um sentimento muito lindo de vivenciar, que é o da libertação. Ser mulher é viver em árduos caminhos, muito doloridos, que estão sendo muito gritados hoje em dia, graças! Mas acredito que apesar de todo sofrimento, não há coisa mais linda. A força que tem, cada uma na sua pluralidade, nas suas visões, nos seus medos. A força do feminino é ímpar. Buscar a significância do feminino na natureza é mais bela ainda. A relação da menstruação com as fases da Lua, com nossas emoções, etc. Antes de mais nada é necessário questionar maneiras de viver que nos são impostas e, infelizmente, ensinadas desde pequeninas. A mais urgente – a menstruação. Nos ensinam a sentir nojo do nosso próprio sangue. Nos ensinam que não devemos menstruar. Aí nos dão anticoncepcionais, cada vez mais cedo, e cada vez mais prejudiciais. Nos ensinam que TPM é um horror porque suas emoções estão à flor da pele e com isso você é surtada. Ensinam que um "buscopan" resolve a cólica em alguns minutos, pois ela é abominável e você não pode se respeitar. Durante muito tempo eu sofria de pensar que a menstruação estava chegando, por tanta dor que sentia. Descobri uma disfunção hormonal que só poderia ser tratada com a tal pílula. Resolvi tentar com chá porque a ideia me agradava mais e, pasmem meninas, a própria ginecologista me disse que com esse tratamento não poderia me ajudar, pois só o remédio resolveria. Pois bem, fiz meu tratamento com chás incríveis (uxi amarelo, unha de gato, artemísia, agoniada...)***, retornei aos exames e tudo resolvido. Sem cólicas assustadoras, sem bombas de hormônios no meu corpo e, infelizmente, sem o apoio de uma médica mulher. Quando entendi a minha menstruação e a relação com meus sentimentos, ela parou de ser um tormento e se tornou o que é: natural. Entendo minha dor, respeito meu momento.  A aproximação com a natureza traz libertação no sentido de você, mulher, se respeitar e se entender. Odores, dores, ciclos, tudo isso é natural. Estamos num tempo de desaprender! Desconstruir! Desobedecer! Sobretudo, um tempo de fortalecimento. 





***OBS: Pesquise também antes de iniciar tratamentos naturais com plantas, chás e ervas. Converse com outras mulheres e busque saber as recomendações para casos específicos. 

                                                       

Renata ou Tetê, a "mãe" do Pé de Amora



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2 comentários:

  1. Adorei! Parabéns pelo texto e pelo empreendimento :)

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  2. Olá Tetê!!! Adorei sua estória e seu trabalho! É inspirador!!! Estou, neste momento da minha vida, na transição para o NOVO (larguei o mundo corporativo ano passado), e na criação da 'minha fabrica' de artes. Criando os produtos, experimentando, pensando no logotipo, fazendo as etiquetas manualmente até entaõ.... Vou torcer para te encontrar na feira holística de Extrema, agora em Julho-2016. abraços fraternos, Tetê (meu apelido tbm é Tetê rsrsrs)

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